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Escolhas Desistentes

  • Foto do escritor: Susan Duarte
    Susan Duarte
  • 28 de mar. de 2023
  • 3 min de leitura

Desistir. Renunciar. Abdicar.

É o oposto do que aprecio - escolher, manter, perseverar.


Escrever sobre escolhas consistentes, no sentido de uma ação positiva é mais agradável. Há outro tipo de escolha, porém, as desistentes, cuja ação é negativa - e dolorosa. Minha amiga, Joana Sofia, depois de ler meu artigo acerca das Escolhas Consistentes, lembrou-me, sabiamente:

Voltar atrás também é escolha.

Não por acaso, ela que é portuguesa, carrega Sofia no nome, a palavra grega para sabedoria. E aí, lembrei-me eu: vou ter de falar das Escolhas Desistentes.


Minha natureza é insistir. Só de pronunciar o verbo desistir, sinto minha relutância corporal e psíquica a tal caminho. Acontece que escolher desistir também é uma escolha. Minha relutância em desistir é a ameaça do arrependimento. Já provei dele - é tão amargo quanto fel e mortífero feito cicuta. Sócrates que o diga!


Às vezes, é possível voltar atrás. Mas nem sempre a vida nos dá essa segunda chance. Em outros casos, ela dispende mil oportunidades e, ainda assim, em plena Quaresma, os Pinóquios-Humanos escolhem Barrabás. Na Chance Número Mil e Uma, não entendem, exasperados, injustiçados, como essa megera - a Vida - os maltratou tanto.

Saem pinoqueando pela vida afora, e a culpa, guess what?, é da Vida!

Escolher perseverar consistentemente é a face gêmea de escolher desistir conscientemente. Enfatizo os advérbios de propósito. Ao longo da minha caminhada, percebi que os verbos são superestimados. Afinal, aquilo que se faz seguidamente perde o sentido conforme o modo que permeia a ação.

Os modos importam. Não é de qualquer jeito, não é a qualquer custo.

A perseverança não é fácil, mas desistir dói bem mais. Perseverar é mais bonito porque enquanto tentamos salvar a pátria ela ainda existe, ainda é nossa, ainda está de pé. Ao desistir, ficamos expatriados, pertencente a lugar nenhum, estrangeiros numa terra estrangeira, enquanto procuramos encontrar novamente um lar, um chão que nos reconheça, um porto que nos acolha, outra mão que segure a nossa e, de uma vez e para sempre, não solte.


Há finais óbvios, que se anunciam por si mesmos - o cinema acende as luzes, a morte apaga a luz, a despedida deixa tudo cinza num ponto final que não se queria dizer, num último abraço que era melhor nem dar.


E quanto aos finais ocultos? Como saber se terminou? Se há solução? Se haverá transformação? Em última e desesperada instância, vale a pena permanecer à espera de um milagre? Pior ainda: como saber se é hora ou não de desistir? Como fechar um ciclo? Eu não sei. Se souber, me ensine.


A Lei da Espiral da Evolução e da Impermanência são leis, tal como a gravidade, independente de sua crença nelas. A cada Oroboro aberto, um sonho é materializado, um novo nível de consciência é atingido, um patamar na espiral da vida é vencido. Persistência, consistência e garra são qualidades vitais à diligência necessária à abertura de um Oroboro. Mas escolha bem suas batalhas. Nem todas as serpentes valem o enfrentamento, nem sempre a cobra não se abriu por incompetência sua - pode ser apenas o Oroboro errado a ser aberto.


Persistência pode virar burrice; garra pode ser desperdício; consistência aplicada a uma situação nociva pode ser destrutiva, e consumir, aos poucos, a chama da Alma.

Desperdiçando o meu mel, devagarzinho, flor em flor, entre os meus inimigos, beija-flor. Cazuza

Discernir é a tarefa mais consciente. É perceber, intuir, distinguir a natureza das coisas por debaixo de suas aparências. Buscar as coisas do Alto, as verticais, sempre soou a mim como a alternativa mais confiável na resolução (enigmática) das coisas horizontais. Vale a pena ou apenas estou queimando fósforos e fantasias? A Sabedoria que vem do Alto há de indicar a chave que abre a porta estreita.

Cortando as ondas. Montague Dawson, 1924.
Cortando as ondas. Montague Dawson, 1924.

Diante de qual escolha estou? É uma escolha que merece consistência ou que exige desistência?! Consulte o seu coração. Ele é a bússola, a intuição é a gênia. Mas leve a racionalidade junto. O perigo é confundir razoabilidade com covardia, bem como a coragem com insanidade.


Em meio a tal malabarismo semântico, eu que só sei que nada sei, deixo a palavra final ao poeta:

O amor é isso. Não prende, não aperta, não sufoca. Porque quando vira nó, deixou de ser laço. Obrigada, Quintana. Anotei aqui: quando vira nó deixou de ser laço. Mas aí, na contramão do poeta, o bom marinheiro diria: é hora de desemaranhar, desfazer o nó, não é hora de desistir. Entre o marinheiro e o poeta, não escolho o conselho nem de um nem do outro.

Escolho os dois.

Boa marinheira, aprendiz de poeta, de nó a laço, sigo cortando as ondas. Respiro, desemaranho, desfaço o nó, e se ainda houver amor, refaço o laço.


Até sempre,

Susan Duarte

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REFERÊNCIAS

  1. Obra Cortando as ondas, Montague Dawson.

  2. Oroboro, símbolo místico da eternidade.

  3. Codinome Beija-flor, Canção de Cazuza.

  4. Livro As aventuras de Pinóquio, Carlo Collodi, 1883.


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