Liberdade
- Susan Duarte

- 4 de jul. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 5 de jul. de 2023
4 de julho é o dia da independência americana.
O grito da independência brasileira, porém, é que vem à minha mente.
Independência ou morte.
Costumo evitar extremos, mas quando se trata de independência o seu único contrário, de fato, só pode ser a morte. Nada mortifica mais do que alguém acreditar-se incapaz de ser livre.
Seja Brasil ou Estados Unidos, ambas as independências referem-se a um país. Mas eu estive pensando sobre outro tipo de independência: aquela que nasce da conquista de nossos territórios internos mais profundos - a independência de ser.
É de senso comum e urgente buscarmos logo cedo a nossa independência financeira. Tal busca é meritosa, muito válida e necessária à dignidade. Sem o seu trabalho, o homem não tem honra, já cantava Gonzaguinha. Mas não será demasiado míope acreditarmos que o dinheiro representa a nossa única liberdade?
Há outras independências na jornada humana tão vitais quanto a financeira.
A conquista do autodomínio através do autoconhecimento. A libertação do ego, a graça de não se sentir agraciado pela lisonja do elogio nem petrificado pela crítica glacial. A capacidade de tomar suas decisões provido de discernimento próprio, imune às falácias alheias, que quase sempre falam e falam o tempo todo, sem nada dizer. A maturidade de assumir a responsabilidade pela sua felicidade, sonhos, vontades, bem-estar, autoexpressão, bancando as consequências, sem culpar ninguém no meio do caminho. Aprender a se nutrir de afeto, autorrespeito e cuidado, compreendendo os ritmos de contração - esforço - e expansão - descanso do corpo-mente.
Para Aristóteles, independência é autarquia, autonomia como fruto da conquista de si mesmo. O sumo bem, indica o filósofo, é a busca da autossuficiência enquanto base da felicidade do indivíduo. Autarquia, pra mim, é a plenitude de ser, fazer, ter, em si, sua própria fonte de magia, em todos os sentidos humanos e divinos - criativo, criador, expressivo, espiritual, relacional, financeiro, realizador, emocional, mental, e quantas mais possiblidades a autonomia possa alcançar.
O princípio da razão objetiva do livre-arbítrio é pilar fundante da estrutura da vida. É direito inato e inerente ao ser humano ser livre. Nascemos livres, por natureza e definição, mas nem sempre tomamos posse de nossa liberdade. Prisões autoimpostas, cativeiros externos, limites internos, ignorância de si mesmo e cosmovisão estreita são alguns dos cadeados que aprisionam a, no mínimo 7 chaves, a nossa autenticidade.
Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós.
Geralmente, o primeiro cativeiro começa em casa. Até que ponto os pais querem que os filhos reproduzam suas receitas, no imperativo de vencer a vida, chamando isso de amor e proteção? E se os filhos, almas individuais vivendo em épocas diferentes, ao contrário dos pais, ao invés de vencer na vida queiram, na verdade, apenas vivê-la à sua própria maneira? Aos olhos dos pais, é uma escolha maluca. Aos olhos dela, dele, estava apenas sendo autêntica(o), agindo na consciência de quem decide pertencer à sua vida, ao seu jeito, e não à aprovação parental e social.
Eis aí o segundo cativeiro - a sociedade, uma entidade abstrata cuja tentativa é encaixar a complexidade humana em perfis comportamentais genéricos, principalmente, aqueles que revelam as tendências de consumo. E ai daqueles que extrapolarem o molde, ousarem sair da caixa, da régua, da regra, d'O Olho Que Tudo Vê - o The Big Brother para Orwell (1984), o Algoritmo para Meta (2023).
Para estes, o tribunal do mundo será implacável: #cancelamento!
Não permito que minha alma sofra tolhimento de forma alguma. Os 4 girassóis cortados representam o corte das nossas duas asas e dois pés. Se não forem livres para buscar o sol da independência, só resta aos girassóis a morte.

Independência extrema, contudo, resulta em isolamento. Primeiro, é preciso ser de si para depois ser do outro. Enfatizo a sequência: ser de si para ser do outro. Nessa ordem, é estabelecida uma dependência saudável, mutualística sim, simbiótica jamais.
Eu não sou uma ilha.
Quero depender, quero precisar, quero ser abrigo e ninho para o outro, bem como desejo repousar nele. Mas tudo isso num limite ordenado.
Colocar a carroça na frente dos bois é querer ser unidade, pertencer ao outro, sem ainda ser de si, pertencendo a si mesmo. A unidade não exclui a individuação, muito pelo contrário, ambas coexistem. A instalação do eu em si, a individuação de cada um, constituem a base da união. Quanto mais fortes e firmes em seu Self forem os indivíduos, tão mais concreta será a unidade. Ser de si para ser do outro: mais uma equação à geometria de viver.

Não alcançamos a liberdade buscando a liberdade, mas sim a verdade. A liberdade não é um fim, mas uma consequência. Leon Tolstói
Qual é a minha verdade? Qual o verdadeiro canto que ecoa da minha'lma? Numa escuta interior, o questionamento é a bússola que conduz ao pertencimento de si mesmo, à conquista do território da autonomia. Afinal, tornar-se independente é tarefa de uma vida inteira.
Eu desejo a autarquia aristotélica, a liberdade vicejante do amarelo de Van Gogh, a autenticidade de cada um dos seus 12 girassóis. Por outro lado, independência demais isola, ao passo que depender em excesso mortifica.
E agora, José? indagaria Drummond.
Vou chamar Aristóteles de novo. Ele já nos deu a resposta. A liberdade de ser, em plena autarquia e autonomia, reside no caminho do meio entre a independência e a morte.
Ali, no meio, é que a vida floresce.
Até sempre,
Susan
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Susan Duarte©Copyright 2023
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